Quinta-feira, 8 de Abril de 2010

Emídio Rangel pode barafustar contra os magistrados por violarem o segredo de Justiça. Os juízes podem pedir a cabeça do homem. Por mim, tudo bem. Só vos peço que não me obriguem a compreender o raciocínio destas cabeças judiciárias quando ditam uma sentença. Estou a falar desta senhora, que matou três pessoas, quando se dirigia depressa para o seu trabalho. O senso comum leva-nos a presumir que foi um acidente horrível provocado pela irresponsabilidade da condutora. O excesso de velocidade e o cansaço fazem parte do infeliz acto. Obviamente, sou incapaz de imaginar qual podia ser um castigo justo ante tanta infelicidade própria e alheia. No entanto, posso ter uma ideia do que me parece que seria um disparate. Por exemplo, posso aceitar que é justa a condenação decidida pelo tribunal de três anos de prisão efectiva. A gravidade do seu acto é independente da sua absoluta falta de intenção. Contudo, tem de haver uma mudança real na sua vida, que represente a sua irresponsabilidade. Mais difícil de compreender é que a pena inclua um ano de inibição da carta de condução. Não se percebe onde o tribunal quer chegar. Eu, por mim, além de indemnizar os parentes das vítimas, aos três anos de prisão efectiva, acrescentava a pena de andar de transportes públicos para o resto da vida, sem possibilidade de conduzir nem sequer uma bicicleta num local fechado. Isso para mim faria sentido. Outro aspecto da conclusão dos juízes deste caso foi que a arguida não assumiu responsabilidades no acidente e “não mostrou arrependimento”, mas antes uma “frieza afectiva”, e “preocupação consigo própria”. Aqui estou totalmente do lado da arguida. A rapariga tem estado a sofrer e está em terapia desde o terrível acidente. Acredito que a terapia tenha sido orientada no sentido clássico do “é preciso seguir em frente, apesar de tudo e devemos ser responsáveis pelos nossos actos”. Se a terapia funciona, muda a perspectiva. Isso pode chatear os juízes. Por outro lado, a atitude do arguido ser tão determinante nos nossos tribunais, aterroriza-me. Um bom e sério assassino em série, se chorasse baba e ranho durante o julgamento, conseguiria alguma misericórdia na justiça portuguesa? Os sinais exteriores de culpabilidade são assim tão determinantes? A ideia de que a nossa justiça tenha em conta a expressividade do arguido para determinar a sua culpa parece-me um filme de terror. Fora isso, tudo bem.



Publicada por Carlos Quevedo às 23:14

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