Segunda-feira, 21 de Junho de 2010

A morte de José Saramago trouxe uma pequena polémica política: o Presidente da República devia ou não estar presente no seu funeral? Aparentemente, Cavaco Silva fez o mínimo necessário. Uma correcta declaração de pesar e reconhecimento era o mínimo que Cavaco Silva tinha a fazer. Ir ou não ir ao funeral era institucionalmente optativo. Optou por não estar presente nas exéquias. Muitos acharam descabido, pouco elegante e até rancoroso. Julgo que as condenações expressas por muito boa gente são exageradas. Por exemplo, tenho a certeza de que se tivesse sido ao contrário, se Cavaco Silva fosse o finado, Saramago não mencionaria sequer a ocorrência no seu blogue. Mas poder-se-á dizer que um Presidente é diferente. Que tem deveres que um cidadão normal não tem. Neste caso, discordo. Cavaco Silva é um político português e os políticos portugueses não se destacam pelo pudor das suas emoções nem pela elegância dos seus actos. Por outro lado, o facto de Saramago ter sido eleito pelos suecos como merecedor de um prémio não me parece um dado relevante. Há muito que sabemos que os prémios Nobel não são um certificado de santidade nem de Übermensch – super-homem em alemão, isto para os de Românicas. Que eu saiba ninguém condenou António Lobo Antunes por não interromper a lua-de-mel. E os laços de rivalidade entre ambos os escritores são conhecidos de todos. Cavaco Silva teve um ano difícil e prevê-se um futuro ainda mais extenuante. Não sendo um jovem, proteger as suas férias pode mesmo ter sido uma decisão terapeuticamente sábia. Muitas outras figuras de Estado, escritores, editores, livreiros, militantes do PCP e de outras forças progressistas também não estiveram presentes no funeral e foram desculpados. A politização do funeral foi tão evidente como inevitável. Saramago foi um escritor que gostava de intervir politicamente e era intransigente nos seus princípios. Não nos podemos surpreender se receber o devido troco. Também deve ficar registada a menção a Deus feita pela Ministra da Cultura no funeral de um ateu impenitente. Foi enternecedora mas inútil. Cheira-me que Deus está noutra há muito tempo. Fora isso, tudo bem.



Publicada por Carlos Quevedo às 23:19
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Comentários:
De ana cristina leonardo a 22 de Junho de 2010 às 13:34
muito pior do que tudo o que relatas é a novela das cinzas... Haja deus!


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